o nível do mar está subindo... e agora?
Cientistas preveem que até 2100 o mar pode invadir e até sumir com algumas cidades.
Santos está na rota das águas e os sinais já são aparentes
Amanda Bento, Bruno Kato, Julia Mayorca
Observar o movimento das ondas quebrando à beira-mar é sempre um espetáculo grandioso. Nos últimos anos, porém, algumas praias em diversos lugares do mundo vêm sofrendo com o avanço progressivo do mar.
A elevação do nível médio do mar é um fenômeno que ocorre por diversos fatores, na sua maior parte causados pelo homem. A alta emissão de gás carbônico na atmosfera desencadeou um processo de aquecimento global que tem provocado mudanças climáticas significativas.
Ponta da Praia é a região mais atingida pelas ressacas
Foto: Stefan Lambauer
Devido ao aumento da temperatura, o gelo que antes estava armazenado em terra, acaba no oceano. Essa elevação do nível do mar pode ocasionar enchentes, desabitação da região litorânea e o desaparecimento de diversas ilhas ao redor do mundo. Além disso, há a previsão de ciclones e tempestades em zonas tropicais se tornarem mais frequentes.
Em 2019, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) apontou em relatório um alerta sobre as calotas da Antártica e da Groenlândia, que perderam mais de 400 bilhões de toneladas de massa por ano, entre 2005 e 2015.
Isso equivale a uma elevação do nível do mar de quase 1,2 milímetro por ano.
Para piorar a situação, as geleiras das montanhas também perderam cerca de 280 bilhões de toneladas de gelo anualmente no mesmo período, aumentando o nível do mar em mais 0,77 mm a cada ano.
De acordo com uma ferramenta desenvolvida por engenheiros do Laboratório de Propulsão a Jato da Nasa, cerca de 293 cidades portuárias do mundo - entre elas Rio de Janeiro, Recife e Belém – poderão ser afetadas pelo avanço do nível do mar, devido ao derretimento das calotas polares e outras massas de gelo.
O surpreendente é que o aumento do nível do mar não vai ser o mesmo para todo o mundo porque os lugares mais distantes das geleiras é que sofrerão mais com o derretimento da massa de gelo. Isso ocorre devido aos campos magnéticos em volta da Terra, que reposicionam essa concentração de água.
Segundo os dados do Centro Nacional de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais (CEMADEN), países como a China, Índia, Bangladesh, Tailândia e Indonésia são alguns dos que estão sob grande risco de inundações.
Veneza, Amsterdam, Nova York e Miami são alguns exemplos de cidades que já estão começando a tomar providências antes que seja tarde demais. Barreiras e diques de contenção, faixas artificiais de areia ou até mesmo casas flutuantes são algumas das ideias adotadas para resolver essa situação.
Estima-se que, mundialmente, até o fim do século cerca de 176 a 287 milhões de pessoas serão afetadas diretamente pelo avanço do nível do mar e enchentes costeiras, podendo causar a migração de 280 milhões de pessoas, comprometendo o PIB mundial entre 12% e 20%.
Orla da praia de Santos
Foto: Stefan Lambauer
PREVISÃO PARA A REGIÃO DE SANTOS
O litoral santista também deverá sofrer com a elevação gradativa do nível do mar nas próximas décadas, mas não é novidade o sufoco que a cidade enfrenta com ressacas e alagamentos cada vez que a maré sobe um pouco mais. Os moradores da orla da Ponta da Praia e da Zona Noroeste conhecem bem esses transtornos.
Segundo estudo realizado pelo Painel Internacional sobre Mudanças Climáticas, o mar de Santos pode avançar 39 centímetros até 2100. Alexandra Sampaio, pesquisadora e coordenadora do Núcleo de Pesquisas Hidrodinâmicas da Universidade Santa Cecília (NPH), explica que, com base nesses estudos “estima-se que o nível do mar poderá atingir valores superiores a 2,7 metros até o final do século”, além de uma possibilidade maior de eventos extremos, como ressacas e maré alta.
Mapa de previsão da região de Santos com o avanço do mar
Foto: NPH-Unisanta
“Na análise realizada pelo NPH para a cidade de Santos, os mapas não consideraram defesas costeiras e modelos de inundação, e se basearam apenas na topografia do terreno. Também não foram considerados os sistemas de macrodrenagem e o efeito das ondas que ocorrem em eventos de ressaca”, explica Alexandra. Nesse sentido, os resultados dessa análise são mais conservadores e os impactos podem ser ainda maiores.
“O NPH-Unisanta realiza estudos e mantém um sistema de previsão de eventos extremos na região desde 2009 e já registrou diversos alertas sobre o aumento do nível do mar”
Alexandra Sampaio
Apesar desse estudo ter sido feito em 2009, as projeções já se mostraram reais. Em outubro de 2016, Santos sofreu uma ressaca intensa, quando a maré atingiu 2,37 metros no bairro da Ponta da Praia e 2,45 metros no interior do estuário, valores que se aproximam da estimativa feita pelo núcleo de pesquisa.
ZONA NOROESTE
A previsão dos pesquisadores é a de que a situação mais grave ocorra na Zona Noroeste por estar numa cota próxima ao mar, o que acentuaria o problema das enchentes.
Rodolfo Bonfim, climatologista da ONG Amigos da Água, considera que a Zona Noroeste carece de infraestrutura para evitar os alagamentos. A melhor alternativa, segundo ele, seria a macrodrenagem, que consiste na retirada do excesso de água do solo acumulada em áreas relativamente grandes, a nível distrital ou de microbacia hidrográfica. O climatologista adverte que a demora na execução dessas obras acarretará um estrago maior futuramente.
Rodoviária de Santos após ressaca de 2016
Foto: Thelma de Souza
Mariani Lourenço, estudante de Jornalismo, morou por seis anos no bairro Jardim São Manoel e passou por uma situação complicada em fevereiro do ano passado. Por conta de uma forte chuva, parte do telhado quebrou, alagando toda a casa. A estudante faz duras críticas à administração municipal.
“Eles nunca fizeram nada. Quando os moradores começaram a reclamar das enchentes no bairro, eles só foram lá e limparam o canal. Uma semana depois, o problema voltou”.
Mariani Lourenço
As obras na entrada da cidade não alcançaram o resultado esperado, conforme Mariani. “Lá nunca foi de alagar, mas desde que as obras da entrada da cidade começaram, a situação é outra. Muita gente perdeu coisas ou teve que se mudar por conta dos alagamentos”.
Problema que afeta muitas regiões do planeta, a alta das marés divide opiniões em relação a sua causa. Neste mini documentários, pesquisadores explicam as possíveis origens para esta situação.
A alta das marés pelo mundo
Nova York
A alta das marés vem trazendo prejuízos à cidade americana mais conhecida do mundo. Em Manhattan o aumento do nível do mar já começou a causar problemas.
Barreiras e calçadões largos estão sendo projetados para criar uma distância maior entre o mar e os edifícios que beiram a ilha. Projeções da Corporação de Desenvolvimento Econômico de Nova York (NYCEDC) apontam que até 2050, 37% de Manhattan pode ficar submersa. E caso atitudes não sejam tomadas agora, em 2100 essa porcentagem sobe para 50%.
Bangladesh
O país com 163 milhões de habitantes e altitudes baixas já enfrenta o aumento do nível do mar há algum tempo e corre o risco de ter 18% de seu espaço submergido até 2500, segundo o Instituto de Simulação de Águas, localizado na capital do país, Daca.
Nessa cidade, a costa se eleva em torno de 1,4 centímetro todos os anos desde 2018, o que forçou os moradores dos pontos mais baixos e próximos do mar a se mudarem, já que as inundações são constantes. O país tentou reduzir o avanço do mar com a construção de diques, mas o esforço foi em vão. Muitas dessas peças, feitas de tijolos e sacos de areia, estão destruídas em diversos trechos.