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Companhia e cuidados na pandemia

Atualizado: 23 de jul. de 2020

Aumenta procura por profissionais especializados em cuidados com idosos


Todos os dias a rotina se repete. O que antes acontecia apenas em horário comercial, de uma hora para outra, se estendeu. Atualmente, a vida da cuidadora Judite Silva se resume ao acompanhamento intenso da idosa Dulce Elena. Os cuidados foram redobrados desde o início da pandemia da covid-19, em março deste ano.


A idosa de 89 anos, que não é acamada ou tem doenças graves, precisa de acompanhamento diário ter problemas nas articulações, que lhe causam dores pelo corpo e um cansaço muito forte.


Judite (esquerda) teve o salário reajustado em 54% para dedicar atenção integral à dona Dulce


Judite descobriu o talento para a profissão ao lidar com o adoecimento dos próprios pais. “Meu pai teve câncer no pâncreas e eu estive com ele em todo esse período. Depois, minha mãe desenvolveu depressão e Alzheimer e eu estive junto dela o tempo todo também. Enfrentar isso me acendeu a luz de poder cuidar de outras pessoas. Então me especializei nisso”. Judite investiu em cursos intensivos de especialização no cuidado de idosos para se tornar uma profissional qualificada.


Moradora Praia Grande, Judite é natural da Paraíba, mas já morou muitos anos em Ribeirão Preto. Após o divórcio, decidiu ficar mais próxima dos familiares que já moravam no litoral de São Paulo.


Desde o decreto da Organização Mundial de Saúde (OMS) sobre a pandemia no país, a cuidadora passou a morar com a idosa, a pedido da família. Por ser solteira e não ter filhos, a decisão de aceitar foi fácil.


Como já estava acostumada com toda a rotina da idosa e da casa, os filhos de dona Dulce entenderam que não poderia ter pessoa melhor para passar pelo período de isolamento com a idosa do que a sua própria cuidadora de tantos anos.


“Minha patroa tem 89 anos e é completamente lúcida. Há três meses que estamos apenas nós duas. Recebi um acréscimo no salário para ficar também aos finais de semana. Sou apaixonada pelo que faço. Fico 100% à disposição para ajudá-la em absolutamente tudo”.


Demanda de profissionais

Segundo o IBGE, o total de indivíduos com mais de 60 anos deve mais que dobrar até 2050, saltando de 9,5% para 21,8% da população e ultrapassando 40 milhões de pessoas. Com a explosão de casos de coronavírus no mundo, a profissão de cuidador exigiu ainda mais dedicação com cuidados redobrados.

O aumento de idosos no país movimenta a demanda por cuidadores de maneira positiva. O Centro de Cursos Brasileiros (Cebrac) registrou um novo aumento na demanda desde 2019, quando a profissão foi regulamentada, fazendo com que a atividade se tornasse mais atrativa e melhor remunerada.


A mudança no salário de Judite é um bom exemplo disso: seu salário deu um salto de 54,5%, passando de R$2.200 para R$3.400 mensais.


Mas não são todos os profissionais da área que têm uma remuneração tão alta. Dados da previdência privada do país, apontam que os cuidadores de idosos recebem entre R$ 1.000 e R$ 1.400, em média, a depender da região do país, do nível de qualificação e do regime de trabalho, segundo empresas de análises de mercado, como a Catho e a Love Mondays.


Mas essa é uma média nacional. No estado de São Paulo, a remuneração fica entre R$ 1.250 e R$ 2.100, e a média salarial chega a R$ 1.500. Já para cuidadores que pernoitam no trabalho, o pagamento mensal fica entre R$ 1.800 e R$ 4.500, segundo a Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia.


De acordo com o Cadrasto Geral de Empregados e Desempregados (Caged), o piso salarial de um cuidador é de um salário mínimo, ou seja, R$1.045 para jornadas semanais de 42 horas.


Desemprego e luto

No mercado há quase duas décadas, a cuidadora Maria Célia do Nascimento já atuou no ramo em várias cidades. Mas ao contrário da forte tendência de crescimento da área em meio à pandemia, Maria perdeu seu emprego.


“Com a pandemia, muita coisa mudou, a idosa que eu cuidava começou a piorar e passou a ser internada com frequência. Por isso, a família diminuiu meu salário pela metade, de R$ 2.000 para apenas R$ 1.000 mensais. Porém, isso durou pouco tempo, pois a Dona Vilma acabou falecendo”, explica.


Muitas vezes por não trabalharem com carteira assinada, profissionais como a Célia fazem acordos financeiros com seus contratantes, até seus idosos voltarem para casa, ou virem a óbito. Nesse caso correu uma diminuição de 50% do seu pagamento mensal, até o momento em que ela perdeu o emprego. “A diminuição no meu salário mudou muita coisa, mas perder ele totalmente mudou bem mais”.


O luto é uma realidade na profissão. Geralmente, os idosos que precisam de acompanhamento em casa necessitam de tratamento intensivo ou estão acamados a ponto de os familiares não conseguirem cuidar sem assistência especializada.


“Quando escolhemos cuidar de pessoas, é essencial sabermos que teremos que lidar com a morte, principalmente no meu caso, que dedico a vida a cuidar de pessoas que já estão no fim dela. Fui cuidadora de 11 idosos e 7 deles faleceram, decorrente dos problemas de saúde adquiridos com a idade avançada”, desabafou.


Atualmente, ao ficar desempregada, Maria optou por aderir ao isolamento social e se dedicar integralmente à família. “Sei que não vou ficar desempregada por longos períodos, mas decidi esperar um pouco, talvez até essa doença passar. Ficarei dedicada à minha família. Minha rotina sempre foi muito cheia, então não sei quanto tempo vou aguentar parada, talvez quando o bolso começar a apertar eu volte a trabalhar”, diz, enfática.

Amor à profissão


Não é possível atuar em qualquer área de trabalho sem esforço, dedicação e muita responsabilidade, tratando-se da vida de outras pessoas. Por isso, a qualificação técnica e profissional é importante em áreas de atuação como a de cuidadores de idosos, porém mais importante que isso é o amor que se adquire pelo próximo, e a certeza de que será feito o melhor para o bem-estar daquele idoso.


Judite se sente feliz em exercer um trabalho árduo, com tanta dedicação e amor. “A família de quem eu cuido me trata como se eu fosse parte da família. Isso muda tudo, com certeza nossa relação é de confiança e companheirismo”, comenta.


Maria Célia descreve sua função com muito carinho. “Cuidar de idosos não é uma tarefa fácil, ainda mais quando estão no fim da vida. Lidar com a morte de uma pessoa que se torna tão próxima não é tão simples, mas eu aprendi a ser forte quando isso acontece. Meu objetivo é sempre fazer meu trabalho com muito amor, pois todos eles mereceram, e muito”, finalizou.




 

Por Nara Vasconcelos || Luiza Pires || Gabriel Somensari || Luan Gabriel Reis


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