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“A minha casa tem um cômodo só, quarto e cozinha juntos e o banheiro separado"

Deise Francisco de Barros, 40 anos, mora com mais quatro filhos na comunidade do Mangue Seco, na Zona Noroeste, em Santos. Sua casa, de 10 m², revela o desafio de cumprir as medidas de isolamento impostas pelos órgãos de saúde.


“A recomendação é manter a distância de dois metros entre as pessoas para evitar a contaminação, eu sei. Se tiver a doença, a gente tem que se isolar em um lugar para não passar o vírus para quem mora junto. A minha casa tem um cômodo só, quarto e cozinha juntos e o banheiro separado. É de alvenaria e fica na comunidade do Mangue Seco, no Rádio Clube, em Santos. Não há espaço para ficarmos longe uns dos outros. Lavo tudo com cloro e sabão em pó e troco a roupa de cama toda semana, é o que tenho feito para manter a limpeza. Álcool em gel não temos, não. Água e luz, sim. Esta é a realidade da minha família. Moro eu e meus quatro filhos: Marcelo Augusto, 19 anos, Alex, 16 anos, Giovana, 8 anos e Luiz Gabriel, de 5 anos.


A comida ainda temos. Em março, antes do início da quarentena, recebi o Bolsa (Família). Com 390 reais comprei uma cesta básica e mistura, assim a gente vai se virando.

Uma vizinha, amiga há mais de nove anos, também me deu uma, além de carne e frango. A renda de casa vinha de mim e do meu filho mais velho. Eu fazia faxina de 15 em 15 dias e cuidava de uma senhora, mas meus patrões me mandaram ficar em casa, pela quarentena e aí fico sem receber. O Marcelo, meu filho, também foi afastado do trabalho. Ele era atendente em um comércio de acessórios para celular do bairro que fechou depois da ordem da prefeitura. O Alex, como está sem aula, tem ido trabalhar com pai dele, fazer um bico, em uma banca de jornal do centro da cidade para conseguir um dinheiro.



Outra ajuda que chega é a pensão dos mais velhos. Os dois maiores têm o mesmo pai, Marcelo e Alex. Todo mês ele me paga e com isso eu mantenho os quatro. Os dois menores não recebo nada. O pai é alcoólatra, possui uma doença séria e não sobra, segundo ele, para me ajudar. Já o outro, caso as crianças precisem de material escolar, remédios, ele me envia o dinheiro. Até meu barraco antigo, uma vez estava despencando, ele comprou madeirite e me deu para o conserto.


Aqui na vizinhança não soube de nenhum caso de coronavírus. Os vizinhos estão reclamando de ficar em casa porque todos trabalhavam avulso, como diarista, cuidavam, de idosos, lavavam roupas para fora e no momento estão sem renda e dependendo de ajuda. Aqui no bairro, as pessoas têm saído, mesmo com o pedido de ficarmos em casa feito pela prefeitura. Os garotos brincam na rua, algumas pessoas saem sem máscara e vão visitar parentes. Muitos não respeitam.


Esta não foi a primeira vez que a minha família precisou de ajuda. Em agosto de 2019, passei a receber aluguel social e me mudei para pertinho, na mesma rua. O barraco que vivia antes, com a minha família, feito de madeirite, tinha um cômodo e ficava próximo a maré. Alguns funcionários da prefeitura e da COHAB (Companhia de Habitação da Baixada Santista), vieram até minha casa e falaram que a gente tinha que mudar para começar a construção da ponte que vai ligar a Via Anchieta à Zona Noroeste.


Com as aulas suspensas, a minha preocupação é com os estudos dos meninos. Meu filho Marcelo e eu damos lápis e borracha às crianças e eles ficam desenhando. Ajudamos eles a escrever, passamos liçãozinha. Meu medo maior é com a Giovana que tem dislexia e dificuldades na aprendizagem. Além da escola de manhã, na UME Esmeraldo Tarquínio, ela frequentava aulas de reforço no período da tarde, na Associação Espírita Seara de Jesus, que também parou de funcionar.


Sei que esta doença é muito perigosa, mas a gente quer ir resolver as coisas e tá tudo fechado! Não consigo trabalhar, as crianças não vão para a escola. Queria saber como vão fazer para passarem elas de ano, se não tem escola! Me sinto impotente, sem poder fazer muita coisa para ajudá-los.”


 

Produção e texto: Larissa Ribeiro II Revisão de conteúdo e apoio na elaboração: Franciele Ferreira, Izabely Carvalho, Luiza de Oliveira e Mariane Luz

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